domingo, 12 de agosto de 2012

Seca


Chegamos após dia longo de estrada e sol quente a vermelhar a face. O calor aqui assusta, a sombra conforta, o vento alivia. Disse Seu Wilson do povoado Santo Antônio, agora onde estamos: “fazem muitos anos que eu não vejo seca assim. Sempre tem seca, mas como esta, com esse calor todo... na minha lembrança só em 1972.” Restou comprar mais ração, que há meses o gado não sabe o quê é pasto. E o saco de ração cada vez fica mais caro, “são os vendedores se aproveitando da necessidade da gente. No início tava R$ 60, esses dias subiram pra R$ 100 o saco, uma semana depois já tava R$ 120! Aí vez ou outra tem que vender bicho, senão compra ração como?”

Dona Nega, irmã de Seu Wilson, já disse: “quero limpar a casa – não dá, pra não gastar a água que o caminhão pipa traz, lá de vez em quando. Quero ir plantar – não dá que como é que a planta vai aguentar? Bicho eu não fico com mais nenhum, nem que queiram me dar, que é maldade com o bichinho, não tem como criar mais do que o que a gente tem. Aí eu fico aqui em casa, matando tempo, fazendo minhas coisinhas, cozinhando... que agora é isso, né?! O tempo agora é esse.” 

Nega morou muitos anos em São Paulo. Passou longo período como costureira de luva e saco de boxe, “duro! Até hoje me dói o ombro” – conta, apontando a dor. Mas decidiu voltar para terra que nasceu, em casa ao lado da casa da mãe, vó tendo sido parteira ali a receber nascimentos nas mãos. E aqui voltou a ser feliz, morar em paz, a prosear agora conosco em tempo sem chuva e a entender os ciclos da terra, das tarefas e da vida.

 
A seca é forte, o calor assusta. Só o que não seca é o calor humano, que este segue vivo e quente como o sol.

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